terça-feira, junho 13, 2006

ELE DEIXOU O MORUMBI E MUDOU DE MALA E CUIA

Recebo envelope com publicações que me havia prometido amigo de São Paulo. Esperava-o já há alguns dias, ansioso por saber o que teria ele para fazer chegar-me às mãos de tão importante [como assinalara em conversa eletrônica de menos de uma semana atrás]. Abro o envelope branco com o logotipo de sua bem-sucedida empresa e, dentro dele, bilhete confirmando que se tratava mesmo do que ele se propusera a mandar.
Surpresa: revistas, muitas revistas, e três ou quatro jornais de cidade do interior paulista. Todos muito bem diagramados, cores firmes, chamadas bem feitas. Pus-me a lê-los, deixando de lado a novela das seis, um dos raros prazeres a que me dedico nestes dias de doença e impossibilidade relativa de andar - a não ser com muitas dores, o que não me agrada - nem, por certo, à sarada leitora, que pode ser vista fazendo diariamente seu "footing" [como dizíamos em anos mais amenos] no calçadão da praia.
Parecia convite - irrecusável - para que eu deixasse os botecos e a conversa jogada fora, típicos dos subúrbios de antigamente, cara que o Leblon insiste em manter. Bem conhece tudo isso meu amigo: foi feliz aqui à época, ainda, do bonde e guarda inesquecíveis lembranças daqueles dias em que se podia andar tranquilamente pelas ruas deste Rio e de outras grandes cidades. Mas, como tudo tem seu tempo certo, partiu para São Paulo onde, com dois outros amigos comuns [que não tiveram a coragem de deixar o Rio], fundou pequena empresa de produtos químicos que só deslanchou de fato quando resolveu assumir - sozinho, com a mulher - a empreitada. Que deu certo e, até hoje, é sua razão de viver.
Não é hora de fazer biografia de ninguém embora ele mereça, de alguém com mais talento que este humilde blogueiro, ter a vida contada; não apenas dele, mas da mulher [uma das pessoas mais encantadoras e corajosas que conheci] também. E que tal biógrafo não esqueça dos duros tempos em que vendiam tomates para a Ceasa e que colhê-los - em dias de chuva, sobretudo - encaixotá-los e embarcá-los era tarefa que apenas os de muita fibra e perseverança eram capazes de cumprir.
Revistas e jornais, fora as conversas que temos mantido pela Internet foram, já o disse, como um convite para deixar o Rio. Ficou em minha cabeça a idéia de viver em uma cidade tão próxima a um grande centro [São Paulo ou Rio] e deles tão distante em modo de viver e de ser.
Em mensagem por e-mail perguntei sobre a empresa: manteve-a onde estava, encerrou as atividades, vai para lá trabalhar diariamente? Respondeu-me o amigo:
"Trouxe tudo pra cá. Vim embora com mala e cuia [mulher, filhos, netos, empresa e empregados que se dispuseram a deixar a capital]. Estamos a trinta quilômetros de São de Paulo. E vivemos em um paraíso. Não fomos afetados pela violência do crime organizado no último dia seis."
Deixo para seu biógrafo evidenciar-lhe a coragem: nasceu em Tres Lagoas , no hoje Mato Grosso do Sul; viveu e trabalhou no Rio; e fez sua vida em São Paulo onde descobriu a mulher de sua vida e criou seus filhos que seguem seu caminho. Seus mais de setenta anos não lhe tiram o vigor, a coragem de continuar a luta, de ser novo a cada dia. Que me desculpe Vinicius: não é preciso que todos sejam iguais a ele para que o mundo seja melhor: ele, sozinho, é capaz de fazê-lo.

Não me perguntem seu nome nem da cidade onde agora vive que não vou dizer; como escreveu conhecido jornalista e escritor dia desses - e eu há muitos anos - sobre capital nordestina tranquila, arborizada e de gente feliz.
Já imaginou essa moçada do Sul Maravilha, da Argentina e de outras bandas desembarcando por lá? Ia perder toda a graça.

Em tempo: meu amigo - desde que o conheço - trabalha de manhã à noite, nunca falta ao batente e teve tempo de estudar. É, minha gente, teve tempo.