quinta-feira, junho 22, 2006

QUEM É O MALUCO DE PLANTÃO?

Parecia filme sobre comício de candidato a vereador em cidade do interior: Dona Canô - sim, Dona Claudionor, ilustre mãe dos ilustres Caetano e Bethânia, à frente, 98 anos, com direito a beija-mão e tudo mais que se tornou de lei por aquelas bandas, Santo Amaro da Purificação [setenta quilômetros de Salvador, BA] - viu "seu povo pacato e ordeiro" pedir ao candidato a reforma do hospital da cidade, a indenização dos empregados demitidos pela Camaçari, a construção de uma fábrica de papel, axé, capoeira, as nunca ausentes sambistas - Nicinha, do samba de roda, à frente - as imperdíveis demonstrações de capoeira, velhinhas e crianças da cidade recebendo os beijos pouco sinceros das autoridades presentes, os inevitáveis bilhetinhos postos nos bolsos dos grandes da terra e de fora dela pedindo emprego e cousa e lousa...

Presentes os ainda lembrados, por poucos, é bem verdade [brasileiro tem memória curta], "anões do Orçamento" - capitaneados pelo ex-deputado federal Genebaldo Correia Alves [presidente, hoje, do PMDB local, provavelmente esquecido - também ele carece de memória mais rica - do tratamento que lhe fora dispensado pelos deputados petistas Zé Dirceu e Mercadante, naqueles dolorosos anos da CPI do Orçamento da União]; Geddel Vieira Lima (PMDB-BA), seu companheiro de faixa, bem no centro da cidade - "Geddel e Genebaldo saúdam Lula". Vale lembrar, para os mais desmemoriados, que Geddel foi chutado para escanteio, já na prorrogação, da lista do deputado Roberto Magalhães, relator, àquela épóca, do pedido de cassação dos "anões" quadrilheiros.

Não se tratou todo este furdunço de festa popular daquelas que a gente vê na Bahia com água na boca. Não, prezada leitora, era simplemente a cerimônia de inauguração dos cursos de Tecnologia da Informação e Eletromecânica naquela cidade.
Nada a ver que se preveja o início das aulas das primeiras turmas apenas para 1º de agosto [suponho que do corrente ano]. Nada a ver que as turmas não disponham de mesas nem de cadeiras. Nada a ver, como reconheceu o próprio dono da festa, que a licitação para a compra dos móveis não tenha sido concluída até agora. Nada a ver que ninguém esteja acreditando que os cursos vão mesmo funcionar.
Como lembrou o pescador Valdeci Santana, 43 anos, morador no distrito de Acupi, sobre o Bolsa-Família, primo-irmão do ensino de Tecnologia da Informção e Eletromecânica no interior do país: "Esses programas do governo chegam bem fraquinhos por aqui."
Importante mesmo foi o que disse - repetindo, aliás, o que já fora dito em outras cerimônias iguais - o festeiro: "Não são os estudantes que devem percorrer o Brasil em busca de escolas, mas os governos que devem colocar escolas onde as pessoas necessitam." Meu neto, 16 anos, aluno da 2ª Série do Ensino Médio no Colégio Pedro II, que já foi padrão no Brasil, três meses sem aulas em 2005 [greve dos professores por melhores salários] - mal e, com o perdão da leitora, porcamente repostas - e, há dois meses já, no corrente ano, pelos mesmos motivos, sem a presença de mestres em salas de aula, pergunta: "Quem é o maluco de serviço? Sua Ecelência, os professores ou eu?"

Dona Canô e Nicinha, coitadas, não foram largadas um minuto sequer pelo ilustríssimo senhor não-candidato, a menos de uma semana de sua candidatura oficial: até lá, a quem interessar possa, haverá, sempre, uma negativa mais firme a cada alusão dos adversários de que Sua Excelència está candidato. Tudo muito bem fotografado, filmado e guardado por seus marqueteiros, não-oficiais, que selecionam o material para quando a candidatura chegar.

Aí sim, preocupada leitora, será "pau na nêga", como dizia velho baiano soteropolitano, amigo meu, da epóca em que morei na Boa Terra.