sexta-feira, maio 05, 2006

O RETROCESSO DE NOSSA POLÍTICA EXTERNA (2)

"...A onda nacionalista que grassa no continente afugenta investidores. Os nacionalistas populistas, com visão estreita, parecem não perceber que investimentos representam desenvolvimento, empregos, renda. Não percebem que até o regime comunista autoritário chinês abriu as portas para o capital externo, inclusive norte-americano, e que com isso vem crescendo a taxas próximas de 10% ao ano. O governo boliviano não parece enxergar que a Petrobrás, investindo pesadamente na Bolívia, revelou enormes jazidas novas de gás e abriu o mercado externo boliviano para essa riqueza nacional, que sepultada sob o solo não gera nenhum retorno. No longo prazo, o maior prejudicado é o povo boliviano, pois a Petrobrás e a Repsol têm na Bolívia investimentos que representam 1/4 do PIB do país; a Bolívia não tem capital nem tecnologia para explorar suas riquezas; e diante do ato governamental de Morales, o mercado internacional (Brasil inclusive) se retrairá fortemente da Bolívia, por falta de confiança.Ainda perplexo, o governo brasileiro se reuniu por longas horas para constatar o óbvio: a Bolívia é um estado soberano, e tem o direito de nacionalizar suas reservas naturais. Procurou justificar o ato boliviano, sem dizer à sociedade como irá defender os interesses brasileiros. Afinal, soberania tem limites, no mundo global atual. Ninguém é soberano o bastante para romper contratos e acordos, ou confiscar bens alienígenas, sem arcar com as conseqüências. Ludibriado pela conversa de Evo Morales, o Itamaraty acreditou que, com nossa dimensão continental e com a pujança da poderosa Petrobrás, (cujo presidente chegou a afirmar que o que acaba de acontecer jamais ocorreria) estaríamos imunes às promessas de campanha do cocaleiro. Nenhuma prevenção foi adotada. A Espanha, também afetada, não hesitou em manifestar uma posição firme: o primeiro-ministro espanhol veio a público dizer que estava alertando Morales sobre a gravidade de seus atos, em lugar de timidamente reconhecer a soberania boliviana (que, aliás, não está em discussão: todos sabemos que a Bolívia é um Estado soberano).Falando dos cuidados do governo Lula com a soberania, é oportuno mostrar que ela tem outras faces. Recentemente, em abril, esteve no Brasil o líder máximo da revolução bolivariana, o venezuelano Hugo Chávez, fazendo campanha em favor do companheiro Lula e pregando, desabridamente, a unificação em termos sul-americanos de movimentos como o MST, a Via Campesina e similares (o que pode incluir os narcocombatentes das FARC colombianas), num explícito incitamento à violência e ao descumprimento de nossa Lei Maior. A soberania brasileira foi agredida por essa intromissão absurda em nossos problemas internos, sob aplausos da esquerda nacional-populista, sem que qualquer membro de nosso governo desse um pio. Com atitudes como essa o coronel, auto-denominado herdeiro do sonho de libertação de Simón Bolívar, vai se firmando como o verdadeiro líder continental e comandante das forças anti-imperialistas e anti-capitalistas, tirando do operário Lula a enfraquecida bandeira da tão ambicionada liderança. Dependendo do resultado da vindoura eleição presidencial no Perú, que pode eleger mais um neocaudilho populista canhoto (Ollanta Humala), o cenário tende a piorar, e não seria espantoso que o Sendero Luminoso, que consumiu anos de lutas e muitas vidas para ser dominado, ressurgisse das cinzas. A América do Sul seguirá (até quando ?) o Comandante Chávez, discípulo do Comandante Castro, de mãos dadas com um indígena nacionalista, um peronista reacionário e um apedeuta deslumbrado, rumo ao abismo.Gigante da América do Sul, o Brasil foi surpreendido com o que foi anunciado e era previsível. Está agora em jogo o abastecimento crucial de gás que representa mais de 50% do consumo nacional, mais de 70% do consumo de São Paulo e 100% do consumo do Sul do país. No mínimo, para que a Bolívia mantenha os suprimentos sem paralisar grande parte da indústria do sudeste brasileiro, iremos pagar preços bem mais salgados pelo produto (que já nos custa mais caro do que à Argentina, e que, pelas regras contratuais vigentes, temos que pagar por um volume mínimo, consumindo ou não). Morales estabeleceu seis meses de prazo para que as empresas estrangeiras renegociem seus contratos com a Bolívia ou deixem o país (ou sejam confiscadas, como declarou um ministro de estado boliviano!). Nacionalização foi o termo escolhido pelo governo da Bolívia, mas de fato trata-se de expropriação, onde 82% de todas as receitas dos investimentos brasileiros em gás e petróleo passam a ser do estado boliviano, por imposição unilateral. O grande Brasil se curva diante do pequeno e pobre país vizinho, que flechou nosso calcanhar de Aquiles. Duro golpe na Política Externa brasileira, que o governo petista exalta como uma de suas grandes realizações. Tudo isso repentinamente, ao mesmo tempo que o governo brasileiro fazia enormes gastos em propaganda, em ano eleitoral, enaltecendo a Petrobrás pela auto-suficiência na produção de petróleo (bastante discutível, de vez que nosso petróleo é sabidamente de difícil refino pela maioria de nossas refinarias, o que significa que continuaremos a importar óleo mais fino do mundo árabe, ao custo de milhões de dólares por ano)..."
(CONTINUA)