"...A onda nacionalista que grassa no continente afugenta investidores. Os nacionalistas populistas, com visão estreita, parecem não perceber que investimentos representam desenvolvimento, empregos, renda. Não percebem que até o regime comunista autoritário chinês abriu as portas para o capital externo, inclusive norte-americano, e que com isso vem crescendo a taxas próximas de 10% ao ano. O governo boliviano não parece enxergar que a Petrobrás, investindo pesadamente na Bolívia, revelou enormes jazidas novas de gás e abriu o mercado externo boliviano para essa riqueza nacional, que sepultada sob o solo não gera nenhum retorno. No longo prazo, o maior prejudicado é o povo boliviano, pois a Petrobrás e a Repsol têm na Bolívia investimentos que representam 1/4 do PIB do país; a Bolívia não tem capital nem tecnologia para explorar suas riquezas; e diante do ato governamental de Morales, o mercado internacional (Brasil inclusive) se retrairá fortemente da Bolívia, por falta de confiança.Ainda perplexo, o governo brasileiro se reuniu por longas horas para constatar o óbvio: a Bolívia é um estado soberano, e tem o direito de nacionalizar suas reservas naturais. Procurou justificar o ato boliviano, sem dizer à sociedade como irá defender os interesses brasileiros. Afinal, soberania tem limites, no mundo global atual. Ninguém é soberano o bastante para romper contratos e acordos, ou confiscar bens alienígenas, sem arcar com as conseqüências. Ludibriado pela conversa de Evo Morales, o Itamaraty acreditou que, com nossa dimensão continental e com a pujança da poderosa Petrobrás, (cujo presidente chegou a afirmar que o que acaba de acontecer jamais ocorreria) estaríamos imunes às promessas de campanha do cocaleiro. Nenhuma prevenção foi adotada. A Espanha, também afetada, não hesitou em manifestar uma posição firme: o primeiro-ministro espanhol veio a público dizer que estava alertando Morales sobre a gravidade de seus atos, em lugar de timidamente reconhecer a soberania boliviana (que, aliás, não está em discussão: todos sabemos que a Bolívia é um Estado soberano).Falando dos cuidados do governo Lula com a soberania, é oportuno mostrar que ela tem outras faces. Recentemente, em abril, esteve no Brasil o líder máximo da revolução bolivariana, o venezuelano Hugo Chávez, fazendo campanha em favor do companheiro Lula e pregando, desabridamente, a unificação em termos sul-americanos de movimentos como o MST, a Via Campesina e similares (o que pode incluir os narcocombatentes das FARC colombianas), num explícito incitamento à violência e ao descumprimento de nossa Lei Maior. A soberania brasileira foi agredida por essa intromissão absurda em nossos problemas internos, sob aplausos da esquerda nacional-populista, sem que qualquer membro de nosso governo desse um pio. Com atitudes como essa o coronel, auto-denominado herdeiro do sonho de libertação de Simón Bolívar, vai se firmando como o verdadeiro líder continental e comandante das forças anti-imperialistas e anti-capitalistas, tirando do operário Lula a enfraquecida bandeira da tão ambicionada liderança. Dependendo do resultado da vindoura eleição presidencial no Perú, que pode eleger mais um neocaudilho populista canhoto (Ollanta Humala), o cenário tende a piorar, e não seria espantoso que o Sendero Luminoso, que consumiu anos de lutas e muitas vidas para ser dominado, ressurgisse das cinzas. A América do Sul seguirá (até quando ?) o Comandante Chávez, discípulo do Comandante Castro, de mãos dadas com um indígena nacionalista, um peronista reacionário e um apedeuta deslumbrado, rumo ao abismo.Gigante da América do Sul, o Brasil foi surpreendido com o que foi anunciado e era previsível. Está agora em jogo o abastecimento crucial de gás que representa mais de 50% do consumo nacional, mais de 70% do consumo de São Paulo e 100% do consumo do Sul do país. No mínimo, para que a Bolívia mantenha os suprimentos sem paralisar grande parte da indústria do sudeste brasileiro, iremos pagar preços bem mais salgados pelo produto (que já nos custa mais caro do que à Argentina, e que, pelas regras contratuais vigentes, temos que pagar por um volume mínimo, consumindo ou não). Morales estabeleceu seis meses de prazo para que as empresas estrangeiras renegociem seus contratos com a Bolívia ou deixem o país (ou sejam confiscadas, como declarou um ministro de estado boliviano!). Nacionalização foi o termo escolhido pelo governo da Bolívia, mas de fato trata-se de expropriação, onde 82% de todas as receitas dos investimentos brasileiros em gás e petróleo passam a ser do estado boliviano, por imposição unilateral. O grande Brasil se curva diante do pequeno e pobre país vizinho, que flechou nosso calcanhar de Aquiles. Duro golpe na Política Externa brasileira, que o governo petista exalta como uma de suas grandes realizações. Tudo isso repentinamente, ao mesmo tempo que o governo brasileiro fazia enormes gastos em propaganda, em ano eleitoral, enaltecendo a Petrobrás pela auto-suficiência na produção de petróleo (bastante discutível, de vez que nosso petróleo é sabidamente de difícil refino pela maioria de nossas refinarias, o que significa que continuaremos a importar óleo mais fino do mundo árabe, ao custo de milhões de dólares por ano)..."
(CONTINUA)